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segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Vozes múltiplas, olhares (des)centrados: Juó Bananere e o Modernismo

RESUMO

Crítica à visão do resgate apenas do sertanejo no Brasil modernista em busca da construção de si. Resgate também esses novos seres criados a partir da recepção do estrangeiro. Nesse contexto, resgate de Juó Bananere, alter ego do poeta Alexandre Marcondes Machado, que escrevia no patois falado pela colônia italiana do Brás, Bela Vista, Bom Retiro na década de 20. Análise da Poesia O Studenti Du Bó Retiro.
 
O texto encontra-se aqui.


O STUDENTI DU BÓ RETIRO

Poisia patriotica


ANTIGAMENTE a scuola era rizogna e franga;
Du veglio professora a brutta barba branga,
Apparecia un cavagnac da relia,
Che pugna rispetto inzima a saparia.
O maestro éra um veglio bunitigno,
I a scuóla era no 
Bellezigno,
Di tarde inveiz, quano cavaba a scuola,
Marcáno o passo i abaténo a sola,
Tutto pissoalo iva saino in ligna,
Uguali como un bando di pombigna.
Ma assi chi a genti pigliava o portó,
Incominciava a insgugliambaçó;
Tuttos pissoalo intó adisparava,
I iva mexeno c'oa genti chi passava.

* * *
Oggi inveiz stá tutto mudado!
O maestro é um uomo indisgraziado,
Che o pissoalo stá molto chétamente
E illo giá quére dá na gente.
Inveiz u ndí intrô na scuóla un rapazigno
Co typio uguali d'un intalianigno,
O perfilo inergico i o visagio bello.
Come a virgia du pittore Rafaello.
Stava vistido di lutto acarregado,
Du páio che murreu inforgado.
O maestro xamô elli un dia,
I priguntô: - Vuc sabe giograffia?
- Come nó!? Se molto bê si signore, -
Quale é o maiore distritto di Zan Baolo?
- O maiore distritto di Zan Baolo,
O maise bello e ch'io maise dimiro
É o Bó Ritiro!
O maestro furioso di indignaçó,
Batte con nergia u pé nu chó,
I gritta tutto virmeligno:
- O migliore distritto é o Billezigno.
Ma u aguia do piqueno inveiz,
C'oa brutta carma dissa otraveis:
- O distritto che io maise dimiro,
É o Bó Ritiro!
O maestro, viremglio di indignaçó,
Alivantô da mesa come un furacó,
I pigano un mappa du Braz
Disse: Mostre o Bó Ritiro aqui si fô capaiz!
Alóra o piqueno tambê si alevantô
I baténo a mon inzima o goraçó,
Disse: - O BÓ RITIRO STÁ AQUI!

Conjugação de Nietzsche e Walter Benjamin: A aura, o dionisíaco e o apolíneo da arte relacional

RESUMO

Análise do movimento de arte relacional, na qual as experiências e repertórios individuais estão a serviço da construção de significados coletivos, o que faz com que a participação do público seja um fator-chave na ativação ou efetivação de tais propostas, principalmente através da obra  Irmãs (2003) de Cinthia Marcelle e Marilá Dardot.

Abordagem do aspecto dionisíaco da arte e do potencial catártico que carregam em si e, consequentemente da necessidade da obra total cometer os excessos que exploram todos os limites além do bem e do mal e da necessidade niilista de não se explicar e viver intensamente em contraposição ás necessidades da aura Benjaminiana.

A arte relacional está menos no momento da interação e mais na construção do que se quer com ela, nessa busca dionisíaca pela harmonia convivial. É preciso tratar a realização como rito, provocar o dionisíaco da arte e o seu potencial catártico e almejar o apolínio.

O texto completo está aqui.

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Romantismo na Inglaterra

RESUMO


Romantismo para além do movimento artístico histórico, definido como uma característica, antes de tudo psicológica. Colocação da Inglaterra entre os países que mais contribuíram para a formação e delineação desse movimento artístico, um país que desde suas origens conflita-se entre a busca das origens verdadeiramente bretãs e a consciência de ser um povo constituído do encontro de muitos povos navegadores, que imprimiu-lhes como marca psicológica essa instabilidade, identificada na incessante busca pelos ideais fundadores e primordiais da sua civilização, no constante elogio à grandiosidade da natureza e do exótico; na predileção por temas tais como o fantástico e o mitológico; e num espírito de independência e um grau de subjetividade que sempre a caracterizou. De Sheakspeare a Damien Hirst.



O trabalho pode ser lido aqui.

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Resenha "Criando um espaço de liberdade: mulheres artistas da África"

A presente resenha trata do texto  "Criando um espaço de liberdade: mulheres  artistas da África", de N'Goné Fall que, como esclarece a nota prévia ao artigo "introduz o tópico do género a fim de assinalar o modo como ‘ser-se mulher’ em África constitui uma condição que em nada corresponde a uma essência, mas um condicionalismo e também  uma possibilidade para o trabalho artístico. Este não se resume evidentemente a questões de género, mas também é sobredeterminado pelos contextos, distintos, em que as artistas trabalham".

A arte contemporânea levanta várias questões de identidade e massificação frente à constatação de que existe "igual" em todo mundo. Mas também é verdade que irradia das suas origens para o mundo todo, e nesse sentido, a arte contemporânea, seja na Ásia, na Europa ou na África, surge também como um modo de afirmar diferenças. Se a arte é processo e, por si, construída, tal como a própria identidade, não há dúvidas que as artistas africanas apresentadas por N'Goné Fall façam arte contemporânea e, principalmente, constroem assim a sua identidade.

A autora nos apresenta que ainda é uma desvantagem ser mulher na África. No continente, a mulher ainda é vista como mercadoria sujeita a humilhações frequentes e destituídas de voz. Mesmo quando as mulheres da África encontram-se com outras culturas não conseguem assimilar com rapidez o choque cultural e as reinserções femininas provenientes dos pleitos feministas inexistentes na África (vide os discursos exixtentes nas obras de Zina Sedira, Maha Maamoun e Zoulikha Bouabdellah).

Mudas, invisíveis e desprovidas de identidade, as artistas da África aproveitam-se da invisibilidade que têm para representar livremente os seus cotidianos através de imagens representativas dessas humilhações e desumanizações. Por isso mesmo, a autora apresenta os trabalhos dessas artistas como metáforas das situações vividas. E, paradoxalmente, tais metáforas são o que conferem a essas mulheres invisíveis, despersonalizadas e marginalizadas, a voz para denunciar, sem concessões, as suas angústias e anseios. E nesse sentido, a arte figura-se como uma transgressão do papel desimportante das suas autoras.

As artistas africanas podem, através da arte contemporânea que realizam, discutir assim, pela primeira vez, a sua condição e o significado de ser africana. Essa discussão não havia na arte tradicional que, sem exibição pública, não permitia uma produção discursiva sobre si e, consequentemente a construção de uma consiência e de uma identidade - e que não havia tampouco na arte popular, que, apesar de ter permitido haver alguma produção discursiva, não foi capaz de movimentar satisfatoriamente a academia para uma elaboração identitária.

É a arte contemporânea, não local, não regional, que tem permitido essa construção. 


sábado, 18 de agosto de 2012

FILE: o incrível festival que encolheu


A 13ª edição do FILE – Festival Internacional de Linguagem Eletrônica acontece em São Paulo, entre os dias 17 de julho e 19 de agosto, no Centro Cultural FIESP - Ruth Cardoso. Ou seja, ainda dá tempo de ir ver se achar que vale a pena.


Bem, o FILE sempre se apresentou como um festival de arte em novas mídias. Mais precisamente, como registra o Wikipedia "é o maior festival de arte e tecnologia no Brasil, e serve como indicador da pluralidade de pesquisas e de produções nacionais e internacionais nas múltiplas áreas da cultura digital: arte interativa, screenings, performances, games, arte sonora, realidade virtual, discussões teóricas e o cinema digital". Que ele nasceu assim, não tenho dúvidas! Mas que ele permanece com essa configuração e essa relevância tenho lá as minhas hesitações (e não é de hoje)!

A discussão entre a fronteira da arte e a pirotecnia tecnológica não é nova. Já em 2006, Paula Perissinoto, organizadora do Festival, lembrava que "[n]essa área, há momentos em que os artistas se perdem na pirotecnia tecnológica. Às vezes, dá certo juntar a pesquisa estética e a tecnológica, neste ano, isso está mais amarrado" (aqui). Mas se em 2006 eles tinham a preocupação de manter a pesquisa estética e a tecnológica amarradas, esse ano eles definitivamente abriram mão do primeiro e o festival se consolidou como uma reunião de macaquices para o espectador. Uma Disney tecnológica desprovida de qualquer preocupação discursiva ou artística.

Tanto é assim que o catálogo, na maioria das vezes, se resume a descrever as obras, explicando os mecanismos técnicos e raramente mencionando propostas. Predominam as obras de interação banal de incluir rostos dos telespectadores em obras de arte famosas e em quadrinhos, ou que nos permita refazer Van Goghs.

A área de Games tornou-se uma coletânea de protótipos invendáveis de versões de games conhecidos adaptados a referências artísticas. Talvez o "Nous", de Pohung Chen mereça uma menção especial pela abordagem da questão identitária e de usar a interação do jogador como um elemento essencial na sua (da identidade) concretização. De resto, recomendo aos artistas conhecer Gilbertto Prado e seu Desertesejos, de nada menos que 12 anos atrás. Gilbertto Prado, aliás, que esteve presente na última Campus Party, que não recebe um quinto de festejo que o FILE tem no mundinho das artes e que está se apresentando muito mais relevante em termos de realização e discussão estética.

São poucas as instalações que propõe mais do que desenvolvimentos tecnológicos, como talvez seja o caso da valise de memórias Sin titulo, de Pamela Cuadros (Chile), o Stressato: Sweeping Spiral, de Jean-Pierre Gauthier (Canadá) e Túnel, de Rejane Cantoni e Leonardo Crescenti (Brasil), mas quando a proposta como um todo abandona a preocupação com o pensamento, ao espectador menos atento fica até difícil perceber essas preocupações perdidas.

No fim, refiro-me ao trabalho SaveMe Oh (Holanda) In search of art, que é assim descrito no catálogo do festival "SaveMe Oh está buscando arte em um mundo digital. Será que conseguirá encontrá-la?". Sugiro a SaveMe Oh procurar em outros lugares... Há muita arte digital por aí, mas não onde SaveMe Oh está procurando!

Em resumo: esse é o último final de semana do Festival, minha recomendação é que perca seu sábado e o seu domingo na fila do Caravaggio e dos Impressionistas. Não acho impossível juntar arte e tecnologia, mas no caso dos dois caminhando separados, prefira a arte do que a feira de ciências.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Nam June Paik: iluminação através da compreensão da subversão


RESUMO: Estudo das obras em que Paik usou a subversão do sinal da
televisão, que originalmente transmite conteúdo, e na discussão que neles se
encerra, qual seja, como tomar o controle para si daquilo que recebemos
passivamente. A discussão proposta da subversão do sinal de TV funciona
como koans zen budistas, trazendo para o espectador a indagação para o
caminho para a libertação. Paik agiu como um abridor de olhos , um mestre
zen para a cultura mediática que ele tanto dominou, pois seguiu um caminho
original, ao moldar o meio de vídeo em seu próprio universo artístico, e, no
processo, re-imaginar a natureza da imagem na arte e na cultura.

PALAVRAS CHAVE: videoarte, nam june paik, zen budismo, subversão


O texto pode ser lido aqui. E foi escrito em parceria com Thais Ramos Capusso Rossini.

terça-feira, 31 de julho de 2012

Música: arte visual

RESUMO

As obras contemporâneas tem se mostrado multissensoriais, nas quais criações musicais se aproximam das artes visuais, e igualmente artistas visuais que incursionaram na música, realizando instalações e performances musicais. A divisão entre artes visuais e música passa a fazer menos sentido,


no plano da estética contemporânea, o que gera uma reivindicação da unidade expositiva das obras de arte visuais, temporais ou de movimento para um experiência completa do espectador, uma vez que os artistas contemporâneos estariam próximos da sua fruição completa da exploração dos sentidos.

O texto pode ser lido aqui.

quinta-feira, 26 de julho de 2012

Arte do corpo, práticas orientadas para o corpo e interferências


A definição de performance encerra duas possibilidades para a realização de uma arte que se utiliza dessa linguagem da ação: Arte do Corpo e Práticas orientadas para o corpo.

Nesse sentido, a performance poderia ser realizada através da manutenção de uma ação, quando o artista ou quem quer que o represente (como a cabra da releitura de Cut Pieces por Laura Lima), realiza uma ação para exibição pública da mesma como um fim em si mesmo ou, de outra forma, a performance poderia ser realizada não como um fim, mas como um meio de realizar outra obra de arte, como as pinturas do Pollock, que precisam de pinceladas que mais são movimentos de dança; ou as fotos da Cindy Sherman que são como registros de suas múltiplas personalidades e exercícios de ser. As ações, nessas duas últimas menções, são fundamentais para a realização do produto obra de arte, que é o resíduo deixado pela ação, seja fotografia, pintura, escultura, etc.

As performances consideradas arte do corpo podem, eventualmente, ser registradas, seja por vídeo ou por fotografia, mas não perdem o caráter de arte pela manutenção de uma ação, e o produto vídeo ou foto não adquirem um status de obra residual, mas sim mero registro. É o caso de obras como Seedbed (1972) de Vito Acconci, que hoje nos chega pelas fotos ou vídeos de seu acontecimento na Sonnabend Gallery[1].

Me pergunto, no entanto, como tratar as obras que são realizada através da manutenção de uma ação (arte do corpo, portanto), mas se realizam e só acontecem por meio de um mediador, como o vídeo, que é a própria obra.

Como categorizar obras como Undertone[2] (1972) ou Theme Song[3] (1973) de Acconci? Obras nas quais temos evidentemente uma arte que se realiza na ação do artista na qual não há representação, mas sim vivência por um sujeito de uma ação que se pretende problematizar e, assim, portanto, apresentam uma performance. No entanto o vídeo não registra a ação, mas sim a media, interfere ativamente na ação realizada mediante cortes e enquadramento, configurando-se muito mais em um trabalho autônomo.

A câmera dessa “videoperformance” , se pudermos assim nomeá-la, é parte fundamental e interferente  na ação, diferentemente da câmera registro, cuja interferência na ação senão inexistente é mínima e cujo produto é algo totalmente diverso. Se o vídeo da mencionada performance Seedbed, por exemplo, não é suficiente para que tenhamos a real experiência da ação, tratando-se de mero documento, as performances Undertone e Theme Song só podem acontecer através daquele enquadramento, de modo que o vídeo é a própria experiência.  A mídia é, portanto, construtora da obra e impõe seu poder sobre a ação realizada: a performance  realizada deixa de ser manutenção de uma ação e passa a ser prática orientada para o corpo.


[1] Vídeo disponível em http://www.ubu.com/film/acconci_seedbed.html, acessado em 09/04/12. Fotos disponíveis em diversas fontes, dentre as quais: http://legacy.earlham.edu/~vanbma/20th%20century/images/1967dayeleven06.htm,  acessado em 09/04/12.
[2] http://www.ubu.com/film/acconci_undertone.html, acessado em acessado em 09/04/12
[3] http://www.ubu.com/film/acconci_theme.html acessado em 09/04/12

sexta-feira, 29 de junho de 2012

Expo: Quim Alcantara



Quim Alcantara usa da beleza para apresentar sua arte que tem como assunto as questões ambientais, fazendo as pessoas, pelo belo, refletirem.

Com tinta acrílica e fibras naturais Quim pinta uma realidade que esquecemos de ver e que, se descuidada, deixará de existir. Quim mistura as coisas da natureza para criar floreletas, bolhóis, petalulhas e outras figuras híbridas, numa explosão de cores quase sempre alegres para despertar o interesse e o deslumbramento.

E toda arte deveria ser vista e discutida, porque a toda arte cabe questionamento e admiração e esses dois objetivos são buscados, e atingidos, pelo Quim, que  através do seu fazer consciente, é capaz de construir uma experiência. 

Por isso mesmo ela está aqui no bar, um local nada institucionalizado de exposições da arte, o mais público e plural possível, trazendo para mais perto do público a obra de arte. E aqui, principalmente, a arte contemporânea que clama por um tempo de digestão, senão ao primeiro contato, para descobrir o que está por traz de todas essas cores e belezas.

A expo fica em cartaz até o dia 04 de julho e todos os quadros estão à venda: info@quim.com.br ou 9239 5579.

sábado, 16 de junho de 2012

Dos livros de arte aos livros-objetos, um passeio na exposição “Eletro-livros” de Guto Lacaz.


Verificamos que o “campo da arte que se expressa pela apropriação artística do livro, em ideia ou pela forma, por meios gráficos ou plásticos, persistindo o livro na criação final, ainda que remissivamente ou remotamente, ou ainda pela sua negação e ausência” é o campo do livro do artista, lato senso.

Esses, inequivocamente, distinguem-se dos livros de arte, que tratam simplesmente do artista. Livros de arte são livros comuns que trazem como assunto crítica de arte, catálogos de artistas, museus, pintura, esculturas e demais linguagens da arte, recheados de fotos numa impressão especial.

Waltércio Caldas conseguiu na sua obra “Velázquez” (1996), transformar um livro de arte em livro de artista, apropriando-se artisticamente desses livros, e atuando pela sua negação, desfocando e esvaziando as obras e textos ali impressos, com o propósito de discutir o fluxo da arte, os livros e a própria obra de Velázquez:

No livro Velázquez13 sugiro que as questões impressionistas foram prematuramente tratadas por este artista (1599-1660), que pintava imaginando que o espectador veria suas imagens de uma distância maior. A pintura impressionista nublava ainda mais o olhar, abstraía mais. Velázquez, de certa maneira, revelava um "desfoque" peculiar em sua pintura - "desfoque" que o impressionismo utilizará depois. Faço essa digressão para ilustrar minha idéia de fluxo nas questões da arte. Considerando os livros em uma biblioteca, notaremos que um livro sobre a Gruta de Lascaux está próximo a um livro sobre Matisse ou Picasso, e estes junto a outros livros de arte do século XVIII e assim por diante. A tendência é que todos estes conhecimentos sigam se acumulando de forma atribulada. Minha intenção ao utilizar a história da arte como matéria plástica é dar crédito a esse fluxo.[1]

Agora, em 2012, Guto Lacaz apropria-se do mesmo objeto, os livros de arte, para transformá-los em livros-objetos, criados a partir quebra da forma convencional do livro, rompendo as fronteiras atribuídas aos livros de leitura, assumindo de vez o livro como objetos de arte.

Em cartaz no Centro Cultural Maria Antonia até 24 de junho de 2012  a exposição Eletro-livros de Guto Lacaz reúne 16 “peças construídas a partir de publicações escolhidas pelo artista em sua biblioteca pessoal”[2] tratando de arte moderna ou dos primórdios da arte contemporânea nos quais o artista deu vida a partir das estruturas eletromagnéticas a eles associadas.

Com a proposta, o artista dá vida às obras de arte nas quais o nosso contato “se dá de modo indireto, justamente por meio de reproduções em livros que tentam suprir a falta de exemplares originais em nossas maiores instituições”[3].

Em cada obra, um livro de arte é aberto na página da foto da obra que se pretende discutir/ homenagear e um mecanismo eletromagnético é disposto junto ao livro de modo que a obra ali representada, seja tridimensionalizada e ganhe um movimento real. Yves Klein, Flávio de Carvalho, Joseph Beuys, Sacilotto, Mondrian, Magritte, são todos trazidos a vida por uma colagem científica de livro e mecanismo.

Os livros de Lacaz, assim, reconhecem e reforçam a condição de veículo do livro impresso, mencionada por SILVEIRA e, nele introduz elementos inovadores de leituras, ao mesmo tempo enaltecendo do uso da página como tal mas imobilizando e descontruindo o a possibilidade de leitura tradicional.

Seus trabalhos são livros-objetos por excelência, pois reafirmam os valores plásticos auráticos (pictóricos ou escultóricos) tradicionais” mencionados por SILVEIRA e,

[a] estrutura livro passa a ser capturada pela estrutura plástica e vemos nascer uma outra forma expressiva. O livro-objeto é um cruzamento de forças que estabelece um novo campo, ao exorbitar os limites e ao se configurar nos vazios criados tanto pela literatura quanto pelas artes visuais[4].


A exposição está em cartaz no Centro Universitário Maria Antônia até 24 de junho.


Rua Maria Antônia, 294 - Vila Buarque - CentroTer a sex das 10h às 21h, Sáb, Dom e feriados das 10h às 18h(11) 3123-5200 Estac. (R$ 12, no nº 176 - convênio)  


[1] HONÓRIO, Thiago. Meio-ato / entrevista com Waltercio Caldas, publicada em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1678-53202006000200002&script=sci_arttext#back, acessado em 08.05.12. A entrevista foi publicada integralmente em HONÓRIO, Thiago. Ensaio. 2006. Dissertação (Mestrado) - Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP), São Paulo, 2006.  
[2] MAIA ROSA, Rafael Vogt. Guto Lacaz: Eletro-livros, in: Catálogo “Exposições” Centro Cultural Maria Antonia, 2011.
[3] Idem.
[4] TERÇA-NADA, Marcelo. Livro-objeto, Revista Etcetera #9 - Artes Visuais, 2000, disponível em http://marcelonada.redezero.org/artigos/livro-objeto.html, acessado em 08.05.12


terça-feira, 12 de junho de 2012

Campos invadidos


A consequência do desenho passar a existir enquanto matéria é a sua liberação do papel. O desenho ganhou também a possibilidade de existir no espaço.  Essa trajetória do desenho pode ser encontrada na própria pesquisa de Edith Derdyk (1955 - ), conforme Joedy Bamonte[1], que refaz o percurso da artista da linha desenhada no papel à linha constitutiva do “corpo que se estendia no espaço”. A base do trabalho de Derdyk é o desenho[2], indiscutivelmente.

Ocorre que Fred Sandback (1943-2003) também realiza trabalhos dispondo linhas de costura no espaço. No entanto, seus trabalhos, de cunho minimalista são identificados pelo próprio artista como esculturas[3].

Temos, então, dois artistas cujo trabalho trazem em si a mesma materialidade (linha de costura disposta no espaço) e, no entanto, são alocadas em campos de ação e linguagens artísticas distintas, o desenho e a escultura. Qual a diferença entre os dois trabalhos  que resulta em categorização e leitura tão distintas?

A problematização não é nova. Jacopo Crivelli Visconti[4] sobre Edith Derdyk diz que “seus desenhos são, eles mesmos, esculturas. Longe de ser apenas simulacros, são feitos da própria matéria de que são feitas as esculturas, e delas ontologicamente inseparáveis”. E tanto Ingrid Rein[5] quanto Stephen Prokopoff[6] questionam Sandback quanto a categorização de seu trabalho, demonstrando algum estranhamento com esse entendimento. Nós mesmo já havíamos levantado essa questão quando realizamos a curadoria da exposição de Andrea D’Amato[7] e na ocasião sugerimos tratar-se de uma diferença de experiências, expectativas e discursos que acabam por imprimir alterações no resultado final”, a linha pincelada versus linha projetada.

De fato, ao realizarmos um levantamento sobre as poéticas e objetivos de Derdyk e Sandback é possível verificar uma diferença substancial de processo e de investigação, de modo que a categorização dos trabalhos não pode realmente ser a mesma, embora apresentem materialidade idêntica.

Sandback afirma categorizar seus trabalhos como esculturas uma vez que seus trabalhos relacionam-se com situações espaciais complexas e tridimensionais e que seus trabalhos são seus modos particulares de complicar e articular uma dada situação e um dado espaço[8].  Sandback vai além, dizendo que suas linhas não são destilações e refinamentos de nada, são apenas fatos que não representam nada além de si[9].

E diferentemente do quanto apontado por Bamonte em Derdyk, o trabalho de Sandback teve início na investigação de perímetros de volumes imaginários[10] e, inicialmente, suas linhas tentavam descrever os limites de um sólido retangular no chão e, portanto, continham todo o senso de contenção que o referia ao objeto escultural. No entanto, com o desenvolvimento, o seu trabalho passou da questão da contenção para uma situação na qual a escultura “vira para fora” e se coloca  em pé de igualdade com o observador nem espaço pedestre.[11]

Esse processo e a questão poética concernentes ao trabalho são completamente distintas da preocupação pelos “elementos mínimos para o desenho se constituir como uma linguagem” presentes em Derdyk. O seu processo de acúmulo de material que transborda, que da rasura no papel ganha o espaço pela impossibilidade de se constrangem em um suporte, dão à sua linha a característica oposta a de Sandback de ser ela mesma uma indicação de outra coisa: a sua linha revelaria o trabalho do próprio “tempo revelando os restos de uma passagem (...) e
transforma-se em  matéria da ausência”[12]

Temos então trabalhos tão distintos na sua origem e que em sua materialidade similar problematizam questões tão díspares quanto a matéria e o volume. Nesse sentido, os trabalhos só poderiam mesmo ser colocados em categorias distintas como o desenho e a escultura.



[1] BAMONTE, Joedy Luciana B. M., O desenho como iminência do acontecimento: uma entrevista com Edith Derdyk, disponível em http://www.educacaografica.inf.br/wp-content/uploads/2011/06/06_O_Desenho_como.pdf, acessada em 15.04.12
[2] MESQUITA, Ivo. Edith Derdyk: Onda Seca, 2007, disponível em http://www.edithderdyk.com.br/portu/depo2.asp?flg_Lingua=1&cod_Depoimento=38, acessado em 15.04.12
[3]  Interview by Ingrid Rein, 1975, disponível em http://fredsandbackarchive.org/atxt_1975rein.html, acessado em 15.04.12
[4] VISCONTI, Jacopo Crivelli. Esculturas desenhadas, 2009, disponível em http://www.edithderdyk.com.br/portu/depo2.asp?flg_Lingua=1&cod_Depoimento=45, acessado 15.04.12.
[5] Interview by... cit.
[6]  An Interview: Fred Sandback and Stephen Prokopoff, 1985, disponível em http://fredsandbackarchive.org/atxt_1985proko.html acessado 15.04.12.
[7] Exposição: Andrea D'Amato - Busca do Espaço, disponível em http://marianadu-arte.blogspot.com.br/2012/03/exposicao-andrea-damato-busca-do-espaco.html, acessado 15.04.12.
[8] No original: “My sculptures have to do with complex, three-dimensional spatial situations. I regard them as my particular way of complicating and articulating the given situation, the existing space, in our case the Kunstraum München with its three rooms” em Interview by... cit.
[9] No original:A sculpture made with just a few lines may seem very purist or geometrical at first. My work isn’t either of these things. My lines aren’t distillations or refinements of anything. They are simple facts, issues of my activity that don’t represent anything beyond themselves. My pieces are offered as concrete, literal situations, and not as indications of any other sort or order” em  Statements, 1977, disponível em http://fredsandbackarchive.org/atxt_1977stat.html acessado em 15.04.2012.
[10] An Interview... cit.
[11] Idem
[12] MASAGÃO, Andrea Menezes. Da sutura a rasura: A costura de Edith Derdyk , disponível em http://www.edithderdyk.com.br/portu/texto_rasuras_andrea%20masagao.pdf acessado em 15.04.2012.