Pesquisar este blog

sábado, 16 de junho de 2012

Dos livros de arte aos livros-objetos, um passeio na exposição “Eletro-livros” de Guto Lacaz.


Verificamos que o “campo da arte que se expressa pela apropriação artística do livro, em ideia ou pela forma, por meios gráficos ou plásticos, persistindo o livro na criação final, ainda que remissivamente ou remotamente, ou ainda pela sua negação e ausência” é o campo do livro do artista, lato senso.

Esses, inequivocamente, distinguem-se dos livros de arte, que tratam simplesmente do artista. Livros de arte são livros comuns que trazem como assunto crítica de arte, catálogos de artistas, museus, pintura, esculturas e demais linguagens da arte, recheados de fotos numa impressão especial.

Waltércio Caldas conseguiu na sua obra “Velázquez” (1996), transformar um livro de arte em livro de artista, apropriando-se artisticamente desses livros, e atuando pela sua negação, desfocando e esvaziando as obras e textos ali impressos, com o propósito de discutir o fluxo da arte, os livros e a própria obra de Velázquez:

No livro Velázquez13 sugiro que as questões impressionistas foram prematuramente tratadas por este artista (1599-1660), que pintava imaginando que o espectador veria suas imagens de uma distância maior. A pintura impressionista nublava ainda mais o olhar, abstraía mais. Velázquez, de certa maneira, revelava um "desfoque" peculiar em sua pintura - "desfoque" que o impressionismo utilizará depois. Faço essa digressão para ilustrar minha idéia de fluxo nas questões da arte. Considerando os livros em uma biblioteca, notaremos que um livro sobre a Gruta de Lascaux está próximo a um livro sobre Matisse ou Picasso, e estes junto a outros livros de arte do século XVIII e assim por diante. A tendência é que todos estes conhecimentos sigam se acumulando de forma atribulada. Minha intenção ao utilizar a história da arte como matéria plástica é dar crédito a esse fluxo.[1]

Agora, em 2012, Guto Lacaz apropria-se do mesmo objeto, os livros de arte, para transformá-los em livros-objetos, criados a partir quebra da forma convencional do livro, rompendo as fronteiras atribuídas aos livros de leitura, assumindo de vez o livro como objetos de arte.

Em cartaz no Centro Cultural Maria Antonia até 24 de junho de 2012  a exposição Eletro-livros de Guto Lacaz reúne 16 “peças construídas a partir de publicações escolhidas pelo artista em sua biblioteca pessoal”[2] tratando de arte moderna ou dos primórdios da arte contemporânea nos quais o artista deu vida a partir das estruturas eletromagnéticas a eles associadas.

Com a proposta, o artista dá vida às obras de arte nas quais o nosso contato “se dá de modo indireto, justamente por meio de reproduções em livros que tentam suprir a falta de exemplares originais em nossas maiores instituições”[3].

Em cada obra, um livro de arte é aberto na página da foto da obra que se pretende discutir/ homenagear e um mecanismo eletromagnético é disposto junto ao livro de modo que a obra ali representada, seja tridimensionalizada e ganhe um movimento real. Yves Klein, Flávio de Carvalho, Joseph Beuys, Sacilotto, Mondrian, Magritte, são todos trazidos a vida por uma colagem científica de livro e mecanismo.

Os livros de Lacaz, assim, reconhecem e reforçam a condição de veículo do livro impresso, mencionada por SILVEIRA e, nele introduz elementos inovadores de leituras, ao mesmo tempo enaltecendo do uso da página como tal mas imobilizando e descontruindo o a possibilidade de leitura tradicional.

Seus trabalhos são livros-objetos por excelência, pois reafirmam os valores plásticos auráticos (pictóricos ou escultóricos) tradicionais” mencionados por SILVEIRA e,

[a] estrutura livro passa a ser capturada pela estrutura plástica e vemos nascer uma outra forma expressiva. O livro-objeto é um cruzamento de forças que estabelece um novo campo, ao exorbitar os limites e ao se configurar nos vazios criados tanto pela literatura quanto pelas artes visuais[4].


A exposição está em cartaz no Centro Universitário Maria Antônia até 24 de junho.


Rua Maria Antônia, 294 - Vila Buarque - CentroTer a sex das 10h às 21h, Sáb, Dom e feriados das 10h às 18h(11) 3123-5200 Estac. (R$ 12, no nº 176 - convênio)  


[1] HONÓRIO, Thiago. Meio-ato / entrevista com Waltercio Caldas, publicada em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1678-53202006000200002&script=sci_arttext#back, acessado em 08.05.12. A entrevista foi publicada integralmente em HONÓRIO, Thiago. Ensaio. 2006. Dissertação (Mestrado) - Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP), São Paulo, 2006.  
[2] MAIA ROSA, Rafael Vogt. Guto Lacaz: Eletro-livros, in: Catálogo “Exposições” Centro Cultural Maria Antonia, 2011.
[3] Idem.
[4] TERÇA-NADA, Marcelo. Livro-objeto, Revista Etcetera #9 - Artes Visuais, 2000, disponível em http://marcelonada.redezero.org/artigos/livro-objeto.html, acessado em 08.05.12


Nenhum comentário:

Postar um comentário