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quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Resenha "Criando um espaço de liberdade: mulheres artistas da África"

A presente resenha trata do texto  "Criando um espaço de liberdade: mulheres  artistas da África", de N'Goné Fall que, como esclarece a nota prévia ao artigo "introduz o tópico do género a fim de assinalar o modo como ‘ser-se mulher’ em África constitui uma condição que em nada corresponde a uma essência, mas um condicionalismo e também  uma possibilidade para o trabalho artístico. Este não se resume evidentemente a questões de género, mas também é sobredeterminado pelos contextos, distintos, em que as artistas trabalham".

A arte contemporânea levanta várias questões de identidade e massificação frente à constatação de que existe "igual" em todo mundo. Mas também é verdade que irradia das suas origens para o mundo todo, e nesse sentido, a arte contemporânea, seja na Ásia, na Europa ou na África, surge também como um modo de afirmar diferenças. Se a arte é processo e, por si, construída, tal como a própria identidade, não há dúvidas que as artistas africanas apresentadas por N'Goné Fall façam arte contemporânea e, principalmente, constroem assim a sua identidade.

A autora nos apresenta que ainda é uma desvantagem ser mulher na África. No continente, a mulher ainda é vista como mercadoria sujeita a humilhações frequentes e destituídas de voz. Mesmo quando as mulheres da África encontram-se com outras culturas não conseguem assimilar com rapidez o choque cultural e as reinserções femininas provenientes dos pleitos feministas inexistentes na África (vide os discursos exixtentes nas obras de Zina Sedira, Maha Maamoun e Zoulikha Bouabdellah).

Mudas, invisíveis e desprovidas de identidade, as artistas da África aproveitam-se da invisibilidade que têm para representar livremente os seus cotidianos através de imagens representativas dessas humilhações e desumanizações. Por isso mesmo, a autora apresenta os trabalhos dessas artistas como metáforas das situações vividas. E, paradoxalmente, tais metáforas são o que conferem a essas mulheres invisíveis, despersonalizadas e marginalizadas, a voz para denunciar, sem concessões, as suas angústias e anseios. E nesse sentido, a arte figura-se como uma transgressão do papel desimportante das suas autoras.

As artistas africanas podem, através da arte contemporânea que realizam, discutir assim, pela primeira vez, a sua condição e o significado de ser africana. Essa discussão não havia na arte tradicional que, sem exibição pública, não permitia uma produção discursiva sobre si e, consequentemente a construção de uma consiência e de uma identidade - e que não havia tampouco na arte popular, que, apesar de ter permitido haver alguma produção discursiva, não foi capaz de movimentar satisfatoriamente a academia para uma elaboração identitária.

É a arte contemporânea, não local, não regional, que tem permitido essa construção. 


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